quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Auxílios criados por deputados representam até 22 vezes o valor de benefícios para famílias pobres de PE

Parlamentares receberão quase R$ 3 mil de auxílio-alimentação, enquanto mais de 2 milhões de pernambucanos estão em situação de insegurança alimentar.

Auxílios de deputados têm valores bem superiores aos benefícios pagos à população

Os auxílios moradia, saúde e alimentação aprovados pelos deputados estaduais representam até 22 vezes o valor pago em benefícios sociais para famílias pobres de Pernambuco, aponta um levantamento da ONG Habitat Brasil .

"A gente tem hoje um valor de um auxílio moradia (pago pelo poder público) que gira em torno de R$ 200 e R$ 300. E quando a gente compara isso com R$ 6.600 para um deputado, é um valor 22 vezes maior do que o recurso que é pago para as famílias de baixa renda", afirma Raquel Ludermir, gerente da Habitat Brasil.

Cada um dos 49 deputados estaduais poderá solicitar até R$ 12.377,37 mensais nos novos auxílios, além dos salários de R$ 29.469,99, reajustados no final de 2022.

Esse gasto contrasta com o cenário do estado, onde mais de dois milhões de pernambucanos estão em situação de insegurança alimentar. Esse número corresponde a 20% da população. São pessoas que almoçam, mas não sabem se vão jantar.

Ana Carla da Conceição, dona de casa que mora na comunidade Caranguejo Tabaiares, no Recife — Foto: Reprodução/TV Globo

A dona de casa Ana Carla da Conceição mora com um filho e cinco netos na comunidade Caranguejo Tabaiares, no bairro da Ilha do Retiro, no Recife. Ela paga R$ 300 de aluguel por mês. Na geladeira e no armário estão alimentos que foram doados.

"Muitas vezes, eles dizem 'vô, compra um biscoito, uma bolacha, eu quero comida e não tem'. Às vezes o povo me ajuda, me dá uma cesta básica. Mas é difícil você ter cinco crianças pequenas, elas pedirem o que comer, e não ter", afirma Conceição.

Mais de seis mil pessoas moram em Caranguejo Tabaiares. A maior parte delas vive com a renda que vem de programas sociais do governo. No dia a dia, os moradores ajudam uns aos outros.

"A gente conseguiu se juntar e melhorar um pouco a vida de cada um. Mas ainda é bem pouco, porque o poder público, ao invés de pegar esse dinheiro e mandar para a gente, para as comunidades, quer para eles mesmos", diz Sarah Marques, presidente do coletivo Caranguejo Tabaiares Resiste.

A comunidade Caranguejo Tabaiares, no bairro da Ilha do Retiro, no Recife — Foto: Reprodução/TV Globo

A dona de casa Andrea Santos perdeu tudo nas chuvas do ano passado. Ela conseguiu receber o auxílio-chuva, no valor de R$ 2,5 mil. Esse dinheiro foi usado para comprar comida para ela e para os cinco filhos.

Sem emprego, a renda que Andrea usa para pagar as contas e viver vem do Auxílio Brasil, de R$ 600 por mês. "Está difícil. E como está!", conta.

A dificuldade no atendimento de saúde também é comum. O pai da vendedora Naliane da Silva Oliveira está internado no Hospital da Restauração, em estado crítico. Ele sofreu um acidente de moto e espera por uma vaga de UTI.

"Meu pai é novo, só tem 54 anos. Ele tem uma filhinha que não tem nem dois anos de idade ainda. Então, assim, eu quero muito. O que eu puder fazer para que o meu pai fique bem, eu quero fazer", afirma Naliane.

Hospital da Restauração fica no bairro do Derby, no Recife — Foto: Reprodução/TV Globo

Mesmo sob críticas da sociedade civil, a maioria dos deputados decidiu aprovar os três auxílios, que podem custar mais de R$ 7 milhões por ano aos cofres públicos.

O patrimônio dos deputados estaduais que propuseram a criação de três auxílios varia entre R$ 263 mil e R$ 4,2 milhões, segundo declaração de renda apresentada pelos políticos ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE-PE) durante as eleições de 2022.

Com a criação dos auxílios, cada deputado estadual vai receber os seguintes valores:

Auxílio-moradia: R$ 6.483,39, o equivalente a 22% do salário;
Auxílio-saúde: R$ 2.946,99, o correspondente a 10% do salário;
Auxílio-alimentação: R$ 2.946,99, o que representa 10% do salário.

Para o auxílio-moradia, existem algumas regras:

O deputado ou cônjuge não pode ser proprietário de imóvel residencial no Grande Recife;
O deputado não pode ter imóvel funcional disponível para uso;
O cônjuge, companheiro ou qualquer pessoa que resida com o deputado não pode ocupar imóvel funcional nem receber ajuda de custo para moradia ou auxílio-moradia.

Por Danilo Cesar e Paulo Veras, g1 PE e TV Globo

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