quarta-feira, 20 de agosto de 2025

CPI da Publicidade: Alepe instala comissão que investiga contratos do governo após trocas de partido e discussões acaloradas

Segundo a denúncia, há a suspeita de que uma das empresas beneficiadas tenha como "sócio oculto" um primo da governadora Raquel Lyra.

Deputados repercutem instalação da CPI que investiga contratos de publicidade do governo de PE

A Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe) instalou, nesta terça-feira (19), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que vai investigar supostas irregularidades em contratos firmados pelo governo do estado com agências de publicidade (veja vídeo acima).

Segundo a denúncia, há suspeita de que um primo da governadora Raquel Lyra (PSD) seja "sócio oculto" de uma das empresas investigadas (saiba mais abaixo).

A composição da CPI foi alvo de disputa entre a oposição e a base de apoio ao governo. Nos últimos dias, três deputados do PSB mudaram de partido para que a oposição fique com mais nomes na composição da CPI. Aliados da governadora disseram que a "manobra" não é válida e entraram com uma ação para anular a CPI, mas o pedido foi negado pela Justiça.

As investigações vão durar até 120 dias, podendo ser prorrogadas por mais 90. Chamada de CPI da Publicidade, a comissão, cuja abertura foi aprovada por 20 dos 49 deputados estaduais, tem nove membros titulares e outros nove suplentes. Cada partido tem direito a indicar um representante.

Na véspera do início dos trabalhos, houve uma "dança das cadeiras" com deputados da oposição migrando para partidos ligados ao bloco governista a fim de ampliar vantagem na comissão. As mudanças incluem a bancada do PSB, que "cedeu" três parlamentares. São eles:

Diogo Moraes, que foi para o PSDB;
Waldemar Borges, que migrou para o MDB;
Júnior Matuto, que seguiu para o PRD.

Em mais de duras horas de reunião no Plenarinho da Casa para definir os membros e eleger os nomes da CPI, deputados governistas tentaram suspender a eleição, se retirando do local antes da votação.

Apesar disso, a mesa diretora da CPI foi formada. Diogo Moraes foi eleito presidente, Antônio Coelho (União Brasil), vice-presidente, e Waldemar Borges, relator. Além desses três, vão compor a comissão os deputados:

Rodrigo Farias (PSB);
Dani Portela (PSOL);
João Paulo (PT);
Nino de Enoque (PL);
Wanderson Florêncio (Solidariedade);
Antônio Moraes (PP).

Dos nove membros da comissão, apenas os quatro últimos (João Paulo, Nino de Enoque, Wanderson Florêncio e Antônio Moraes) são considerados apoiadores da gestão Raquel Lyra. Líder do governo na Alepe, a deputada Socorro Pimentel disse que entende a articulação como "manobras" para atrapalhar a atuação da bancada governista.

"A fiscalização é inerente à atividade parlamentar. E nós concordamos com qualquer tipo de embate, de debate, no aprofundamento das ideias das discussões políticas aqui na Casa. O que a gente não concorda é com as manobras que foram feitas no sentido de alterar a composição dessa comissão para que a gente, enquanto governo, não tivesse os seus deputados, os seus líderes, indicando os membros", declarou.

Segundo a deputada, os governistas se retiraram da reunião porque não viram legitimidade nas trocas partidárias.

"A premissa para a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito [...] é a lisura e a transparência. Quando a gente não vê isso sob essa ótica, a gente já não dá o aval nem a credibilidade devida que essa comissão deveria ter", disse.

Já o deputado Diogo Moraes, que vai presidir a comissão, afirmou que vai conduzir os trabalhos da CPI com "responsabilidade" e "tranquilidade".

"É uma obrigação nossa ser imparcial, a gente poder organizar tudo o que chegou à CPI para que a gente apure os fatos, a gente tem que dar o direito à ampla defesa. A gente tem que escutar as partes e produzir um relatório que vai ser entregue ao plenário. [...] Nós queremos que se aprofundem as investigações", afirmou o deputado Diogo Moraes.

Questionado sobre a troca de partido, o parlamentar disse que a mudança não tem "nada a ver" com a instalação da CPI e foi decidida depois que ele recebeu um convite do deputado Álvaro Porto, que é presidente da Alepe e do PSDB estadual.

"Nós temos várias discussões, principalmente, partidárias. Recebi um convite do presidente Álvaro Porto para fortalecer o PSDB aqui na Assembleia Legislativa, como tem vários outros movimentos sendo feitos, só que, nesse momento, recebi a anuência do meu antigo partido, o PSB, para que a gente pudesse fortalecer o partido aqui no estado", afirmou.

Já o deputado Waldemar Borges declarou que a CPI foi criada para apurar "com isenção" os indícios "graves" de irregularidades nos contratos do governo.

"A CPI exista exatamente para isso: levantar essas informações e poder, enfim, concluir pela veracidade ou não dos indícios que estão sendo apresentados", disse.

Alepe instala CPI que vai investigar contratos de publicidade do governo de Pernambuco — Foto: Reprodução/TV Globo


Contestação judicial


Após a formação da CPI, a deputada Débora Almeida (PSDB), que apoia a governadora, entrou com um mandado de segurança pedindo a anulação do processo na Justiça, sob o argumento de que Diogo Moraes não poderia ser representante do partido por estar filiado à legenda há menos de seis meses.

O pedido, no entanto, foi negado pelo juiz Fernando Jorge Ribeiro Raposo. O magistrado considerou que o movimento representa um ato de gestão interna do partido e, por isso, não caberia à Justiça resolver o impasse.

"O presidente de comissão interventora estadual de partido político, ao praticar atos de natureza interna corporis, não atua como autoridade pública, mas sim como gestor de pessoa jurídica de direito privado. Portanto, em princípio, não é cabível mandado de segurança para questionar seus atos", afirmou o juiz na decisão.

À TV Globo, a deputada disse que considera a composição da CPI "ilegal" e que vai recorrer. "A CPI é totalmente ilegal, não tem um fato determinado, e a constituição dos membros que foram indicados contraria os regimentos e os estatutos dos partidos e o próprio regimento deste Casa", afirmou.


Denúncia

A abertura da CPI foi aprovada no dia 4 de agosto, atendendo a um requerimento feito pela deputada Dani Portela (PSOL). Na solicitação, a parlamentar apontou "indícios de direcionamento ou conflito de interesses" envolvendo a governadora e familiares dela.

No texto, a deputada pediu que os parlamentares investigassem um contrato de dez anos, que pode chegar custar R$ 1,2 bilhão, entre o governo e agências de comunicação. Uma delas, a E3 Comunicação Integrada Ltda., de São Paulo, é suspeita de ter "sociedade oculta" com um primo da governadora, o empresário Waldemiro Ferreira Teixeira.

Segundo o requerimento, logo após vencer a licitação, a empresa anunciou a abertura de uma filial no Recife, num imóvel que pertence ao parente de Raquel Lyra, no bairro do Pina, na Zona Sul.

Conforme o documento, no mesmo mês em que a agência venceu o processo licitatório, em abril, uma funcionária da agência Makplan, que pertence a Teixeira, deixou a empresa e passou a trabalhar na E3 Comunicação, o que levantou suspeitas de que ele seria "sócio oculto" da concorrente.

Além disso, conforme a denúncia, outro contrato, firmado em 2019, foi prorrogado por mais de sete vezes, ultrapassando o limite de 60 meses (cinco anos) previsto em lei, a um custo adicional de R$ 100 milhões.

O que dizem os envolvidos

Procurado, o governo de Pernambuco informou, por meio de nota, que o processo licitatório de publicidade institucional foi conduzido "de acordo com a legislação vigente e com critérios técnicos, objetivos e públicos, sem quaisquer interferências externas".

Segundo a gestão estadual, o modelo adotado pela Secretaria de Comunicação respeitou os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade e transparência e seguiu a jurisprudência consolidada do Tribunal de Contas da União (TCU) e práticas utilizadas pelo governo federal e por outros estados brasileiros, "garantindo, assim, a correta aplicação dos recursos públicos".

Em nota divulgada no dia da aprovação da CPI, a agência E3 Comunicação informou, também por nota, que venceu a licitação com outras três empresas (Nova SB, Agência UM e BTS) para gerenciar um contrato de R$ 120 milhões por ano, a depender do desempenho de cada agência e do vencimento ou não de concorrências internas entre elas. A empresa disse, ainda, que "todo o processo seguiu à risca a lei e as diretrizes da licitação".

Já Waldemiro Teixeira afirmou que não é, "direta ou indiretamente, sócio de qualquer agência participante ou vencedora da licitação mencionada". Ele também disse que "qualquer tentativa de estabelecer essa associação é infundada e será contestada pelas vias legais cabíveis".


Por Mario CarvalhoArtur Ferraz, TV Globo e g1 PE

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